John Wick: Ecos de um Passado Cinematográfico
Por Adriano de Oliveira Pinto
John Wick: Um Novo Dia para Matar (2017) não constitui simples entretenimento ou filme de violência tão desenfreada quanto gratuita, embora possa, num primeiro olhar, assim parecer. Sua ação é cuidadosamente coreografada, com uma fotografia caprichada, design de som detalhista e apuro técnico. Isso já diferenciaria o longa dirigido pelo norte-americano Chad Stahelski de similares menos elaborados. Porém, é seu diálogo com o cinema de outrora que lhe torna mais interessante e merecedor de algumas observações.
Há referências cênicas nessa obra a pelo menos três filmes clássicos. A primeira, direta, reside na sequência que abre o novo John Wick, onde há uma gigantesca projeção de uma fita muda protagonizada por Buster Keaton na fachada de um prédio. A segunda é mais discreta, traçando um paralelismo entre os significados dos pombais de Joey (Ben Wagner, em Sindicato de Ladrões, de Elia Kazan, 1954) e do personagem interpretado por Laurence Fishburne no longa de Stahelski.
A terceira se mostra evidente. Depois que Orson Welles filmou a célebre cena do conflito na sala de espelhos em A Dama de Shanghai (1947) – e que saudade de Rita Hayworth, bela não apenas usando as longas madeixas com que protagonizou a sensual Gilda um ano antes, mas também de cabelos curtinhos como nesse filme –, vários a revisitaram. Operação Dragão (1972), com Bruce Lee e conduzido por Robert Clouse, é um dos exemplos mais frutíferos. Por outro lado, Andrei Konchalovsky, mesmo contando com o talento de Jack Palance no elenco, não foi tão feliz na recriação de tal passagem em Tango e Cash – Os Vingadores (1989), estrelado por Sylvester Stallone e Kurt Russell. O mesmo Konchalovsky que iria esperar quase trinta anos para ter novamente um filme seu projetado nas grandes telas do Brasil, através da curta e recente passagem por nossas salas da excelente produção russo-alemã Paraíso (2016), que esteve na shortlist (semifinal) de Filme Estrangeiro do Oscar 2017 e deu a seu diretor o Leão de Prata em Veneza quando de sua última edição. Pois Stahelsky faz uma longa cena de ação em um labirinto de espelhos situados numa fictícia instalação artística, sarcasticamente intitulada “Reflexos da Alma”, localizada no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, para reencenar, com boa técnica e indispensável sangue, a inspiradora ideia-prima da obra de Welles.
Ao resgatar a figura do ator Franco Nero – o icônico personagem Django de diversos spaghetti westerns e protagonista do cultuado Keoma (1976) – , John Wick: Um Novo Dia para Matar também dá um passo interessante nessa sua conexão com o cinema do passado, para não falar em seu próprio estilo, que remete às obras de ação física hollywoodianas dos anos 1980 e a vários dos títulos que pontuaram as carreiras dos diretores John Woo e Sam Peckinpah e aqui a associação com seu Elite de Assassinos, 1976, é inevitável.