Perpétuo (2018), Lorran Dias
por Juliana Costa
Em algum momento do filme Perpétuo (2018), de Lorran Dias, exibido na Edição Especial da Ohun – Mostra de Cinema Negro de Pelotas, abre-se uma cortina. Após o sobrevôo do olhar identificar entidades em meio às ruínas de um casarão, um corte revela uma personagem, também entidade em cena anterior, abrir dois lençóis a emoldurar um homem e uma mulher conversando em uma cena doméstica.
É nesta construção que Perpétuo nos insere ao longo de seus 24 minutos: na encenação do cotidiano. Construção também parece ser a palavra exata. O filme se passa em parte em uma casa em construção, em direção ao futuro, enquanto um outro mundo, localizado no passado provavelmente, se pronuncia em meio a ruínas. Não sabemos o quanto um interfere no outro, mas sabemos como a encenação do dia a dia interfere naqueles personagens e mais, na própria percepção do diretor.
O filme vai ficando cada vez mais explícito nas suas construções de cena. Uma dupla de amigos troca carinho sob a moldura de portas e janelas; uma personagem é transformada em cantora pop pela câmera giratória que acompanha o espetáculo cotidiano de escovar os dentes: tudo é vida e toda vida é encenação. Encenar a vida parece um exercício de cuidado.
Ao final, uma frase exclamativa marca uma mudança de atmosfera: “Alex, arrombaram o carro do filho da Marilda e tão dizendo que foi você, Alex!”. No close em movimento do personagem, Perpétuo se veste de filme de ação. Uma trilha grave, uma cidade cinza, trilhos de trem. Os créditos surgem, mas a sensação é de que outro filme está começando. Talvez seja um prenúncio de que o próximo filme de Dias esteja pronto para se descolar um pouco mais do dia a dia e permitir que os personagens encenem outras tantas vidas.