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Publicado por em mar 23, 2014 em Artigos |

Piriapolis en Película 2011

afichePor: Willian Silveira.

O Uruguai não está mais para coadjuvante. Seria esta a conclusão caso pudéssemos sintetizar a fala de cada um dos debatedores, profissionais do cinema e da imprensa, durante a 8ª edição do Piriapolis en Película. O festival que transcorreu no agradável balneário uruguaio durante os dias 5, 6 e 7 de agosto confirmou a suspeita levantada durante a última década por filmes como 25 Watts (Juan Pablo Rebella e Pablo Stoll, 2001), Whisky (Juan Pablo Rebella e Pablo Stoll, 2004), O Banheiro do Papa (César Charlone e Enrique Fernández, 2007) e Gigante (Adrián Biniez, 2009): o país não está mais para coadjuvante.

Realizado no suntuoso Hotel Argentino – cuja construção do início do século XX resgata à memória as primeiras cenas do barroco O Ano Passado em Marienbad –, o clima de diálogo entre produções da América Latina foi a marca do festival.

A primeira noite foi reservada quase que exclusivamente para a homenagem a Carlos Sorín. A rememoração da trajetória do diretor argentino e a comemoração dos vinte e cinco anos de La película del Rey (1986) colocaram como pano de fundo os longas argentinos Ausente (Maco Berger, 2011), La felicidad es una leyenda urbana (Tetsuo Lumiére, 2009) e do uruguaio El destino (Oskar Vidal, 2010).

O sábado, repleto de atividades, ofertou ao público diversos interesses. As conferências abordaram desde as experiências na formação de profissionais de audiovisual, passando pelo debate acerca da projeção do cinema uruguaio no mundo, até encerrar com o disputado Master Class dos cineastas Adolfo Aristarain y Carlos Sorín. À parte, a exibição de curtas-metragens, incluindo a mostra em competição, lotava as salas com estudantes e jovens realizadores. Enquanto isso, no Salón Dorado Ulises (Oscar Godoy, Chile e Argentina, 2010), Civiles y Militares SS (Miguel Rodríguez Arias, Argentina, 2010), Lo que más quiero (Delfina Castagnino, Argentina, 2010) e El camino del vino (Nicolás Carreras, Argentina, 2010) anteciparam as homenagens a 25 Watts, filme uruguaio de baixo orçamento que marcou a cinematografia nacional, a José Wilker, pelos trinta e cinco anos de Dona Flor e seus dois maridos, e a Adolfo Aristarain, pelos trinta anos da estréia do clássico Tiempos de Revancha (1981).

O terceiro dia, ainda que com ares de desfecho, não deixou por menos. Os debates sobre a última década do cinema no Uruguai e longas como La peli de Batato (Goyo Anchou e Peter Pank, Argentina, 2010), Amateur (Néstor Frenkel, Argentina, 2010), Exiliados (Mariana Viñoles, Uruguay, 2011) e Desbordar (Alex Tossenberger, Argentina, 2010) aumentaram a expectativa sobre os vencedores da competição de curtas. O júri composto pelos uruguaios Carlos Raúl Oroño (La República) e Victor Vicente (Uruguay Campus Film), e pelo brasileiro Willian Silveira (ACCIRS e ABRACCINE) premiou El vendedor de naranjas (Agustina Willat, 2010) e Intercambio (Antonello Novellino e Antonio Quintanilla, España, 2010) como Melhor Curta Nacional e Internacional, respectivamente. A atriz Sofía Lans e o curta Dr. Seymour (Alfonso Guerrero, Uruguai, 2011) receberam menção especial.

Por mais de uma vez, assinalou-se que os produtores e realizadores uruguaios haviam compreendido o grande dilema da Sétima Arte. Em algum momento, todo país precisa decidir qual será o lugar reservado na sua esfera cultural para a produção cinematografia. A equação pode parecer simples vista de cima, porém ganha complexidade e relevância na medida em que se analisam suas variáveis, pois implica em decidir se o sucesso da produção cinematográfica nacional será uma questão contingente e ocasional ou recorrente. Bem conhecemos a primeira opção. Fazer cinema é uma atividade que exige um sistema articulado entre diversas formas de apoio, o que significa não deixá-lo por conta própria e à mercê dos ventos. A segunda possibilidade, por sua vez, não é menos complexa, uma vez que a construção das bases de um cinema nacional não deve limitar-se aos interesses e às exigências de uma política cultural ou de um governo.

Como bem destacou o texto de meu amigo e crítico Raúl Gadea, os avanços tecnológicos dos meios de produção modificaram a mecânica do fazer cinematográfico e interferiram diretamente na acessibilidade da produção. Nunca foi possível realizar tanto com tão pouco, como nos prova cada uma das cenas estilisticamente brutas de 25 Watts. No entanto, se a visão romântica permite enxergar grandiosidade e enobrecimento nas limitações técnicas, na realidade o público é que acaba fadado a um mesmo e único cinema. Troca-se o nome do filme, mas o que enxergamos na tela é essencialmente o mesmo.

Pela encruzilhada na qual se encontra o cinema de um país culturalmente rico – uma linha de Onetti fala mais que todo o existencialismo de Sartre –, o que se pode sentir é a vontade empenhada em comprar a responsabilidade de estruturar uma indústria cinematográfica. O mais importante já está em debate: como contornar as dimensões de país pequeno. Se por um lado o mercado consumidor interno pode ser um problema – e aí entram as estratégias de divulgação e a exploração de temas -, por outro, o idioma espanhol abre portas que a nós, lusófonos, nos parecem inexistentes. A casa (La casa muda, Gustavo Hernández, 2010), uma das últimas produções uruguaias, foi realizada tendo em vista o mercado de gênero americano. Hollywood pagou bem e levou a idéia para adaptá-la ao seu gosto. Essa visão de negócio, longe de ser a única possível para um produto que necessita conciliar a esfera da cultura com a econômica, proporciona diversidade de gênero e, conseqüentemente, solidifica qualquer cinematografia.

Pode ser o caminho. O primeiro passo foi dado.